domingo, 31 de maio de 2020

O Brincando com as Estrelas desse mês esteve conversando com Marcos DeBrito, confira!

Lá estava eu, em um dos meus lugares favoritos, quando ouvi um vendedor gritar para uma senhora: “O Escravo de Capela está esgotado, senhora, e sem previsão de chegada. Sugiro que solicite pelo site para que a mesma possa acompanhar. Nós não temos previsão de quando chegará esse livro de novo aqui na Saraiva”.



1 - Com uma construção fantástica e emocionante, baseados em registros históricos, uma recontação de uma de nossas lendas mais famosas, como se sente, Marcos, com todo esse sucesso do Escravo de Capela? Deve está muito orgulhoso, você imaginou isso, essa repercussão toda, o retorno que vem lhe trazendo?


R: Em primeiro lugar, super obrigado pelos elogios ao livro. A gente sempre torce para que um trabalho atinja o maior número possível de pessoas, porém eu não tinha certeza se conseguiria porque o tema da escravatura é muito delicado. O leitor mais desavisado pode achar que é um romance histórico monótono que se passa em uma das épocas mais cruéis da nossa História, quando, na verdade, é um terror bem sombrio que usa o mal da escravatura como combustível para uma rebelião sobrenatural. Eu tenho bastante orgulho desse livro e acho que a aceitação dos leitores foi reflexo dessa minha confiança de ter criado algo interessante com elementos da nossa cultura e passado trágico.



2-Conte-nos um pouco sobre a construção dessa obra, da onde surgiu a ideia, um extra dessa construção excelente. E pretende fazer um longa dele? Me peguei imaginando um filme e ficaria muito legal.


R: Alguns leitores acham que o ponto de partida foi repaginar uma das nossas principais lendas de maneira mais adulta, resgatando o horror original que existia nos nossos personagens mitológicos, no entanto minha intenção inicial foi contar uma história sobre vingança e superação. Ambientei a trama no Brasil colônia e coloquei a escravatura como tema principal. Pesquisei muito sobre os costumes da época, sobre as fazendas de cana, o comportamento dos Senhores de Engenho e como viviam os escravos nas senzalas. A ideia de um rapaz que voltaria após ser morto surgiu naturalmente por causa da mina inclinação para o terror. E o modo como ele seria morto me trouxe a ideia de usar a lenda do Saci. A partir disso, novas pesquisas foram feitas e o enredo ganhou mais força, tornando-o essa releitura folclórica.
Interessante você mencionar o livro como filme porque ele foi escrito originalmente como longa-metragem. O projeto já existe, com elenco sugerido, roteiro e orçamento prontos. Estamos tentando, mas não é muito fácil por causa do valor para realizá-lo e a duração. Para adaptar o livro todo, precisaria de uma série ou um filme de quase 3 horas. E a preferência do mercado é por longas com até 90 minutos.



3-Você pretende continuar recontando lendas do nosso folclore, trazendo um pouco mais sobre um Brasil no qual nem todos conhecem, ou trata-se apenas de um volume único?


R: Eu nunca escrevo uma história pensando em continuações ou partes de uma coleção. Gosto de me dedicar inteiramente a o que estou escrevendo para atingir um resultado que eu goste. Como "O Escravo de Capela" não partiu da ideia de repaginar os mitos nacionais, quando eu encontrar algum outro personagem folclórico que se encaixe perfeitamente em uma, trama talvez isso possa acontecer de novo. Por enquanto não tenho essa pretensão. No entanto, meu primeiro romance, "À Sombra da Lua", também é sobre uma criatura mitológica: o lobisomem. Considero-os "livros irmãos" porque ambos são de época, com o mesmo estilo de trama, de escrita e também repagina o imaginário popular para torná-lo mais verossímil.




4-Akili, Sabola, Fazenda Capela, enfim; onde começa e termina ficção e fatos reais propriamente ditos? Fiquei refletindo muito sobre isso  ao termino da leitura.


R: Propósito atingido! Rs. Eu quis mesmo escrever de maneira que deixasse os leitores em dúvida sobre o que foi criado e o que poderia ter, de fato, existido. Essa é uma das vantagens de ambientar bem uma história, com informações verdadeiras da época na qual ela se passa. Todo o cenário social e político no livro é real. O Brasil estava dependente de Portugal, a cana era o principal produto de exportação e nosso país estava longe dos outros na questão da abolição da escravatura. Eu coloquei vários desses discursos na boca dos personagens, sem jamais me afastar da trama. Conseguir mesclar informações verídicas com a ficção, de um jeito que elas não incomodem o enredo, é um bom modo de trazer essa sensação no leitor. O que criei foram os relacionamentos entre personagens e história de cada um, inclusive as do Akili e do Sabola. Para eles, fui atrás das mais diversas lendas que existem sobre o Saci, tanto as indígenas, como as africanas e portuguesas, e inventei uma que soasse mais crível. Uma que realmente poderia ter existido.



5-Inclusive, galera, no livro alguns capatazes da fazenda apelidavam o Akili, de “Preto Velho”; trata-se do preto velho retratado na religião africana? Olha que daria uma boa continuação, rssrsrsrs. Fale mais detalhadamente desse personagem em especial, assim como tantos outros no qual não irei citar para que não acabe dando spoiler. Já pensou nisso? Ou alguém, editora, fãs, leitores betas, enfim te pediram isso?


R: A referência é ao preto velho retratado na religião africana, sim. Sua imagem, postura e função na trama confirmam isso no decorrer da história sem ser algo explícito. Eu gosto sempre de jogar as ideias para serem pegas pelos leitores mais atentos.
Os pedidos que me aparecem são mais para repaginar os demais personagens do nosso folclore do que fazer uma continuação propriamente dita. E isso vem de vários leitores. Não sei se penso em usar meus mesmos personagens em outras histórias, mas algo bem legal que aconteceu foi que um escritor da Suma, que terá seu livro lançado em abril, quer fazer um crossover com o personagem dele e o Sabola. Eu adorei a ideia, mas não posso falar nada a respeito agora.



6-Agora nos conta um pouco sobre suas outras obras. Esse é seu terceiro livro, né? Conte um pouquinho para a galera sobre esses outros livros; conte-nos um pouco também sobre seus outros projetos, como cineasta premiado, diretor, roteirista, escritor... Você vem sendo considerado uma grande renovação na produção de filmes no Brasil. Andei dando uma pesquisada e o seu primeiro longa-metragem “Condado Macabro”, que foi lançado em 2015, está nos representando muito bem, não somente aqui no país mas no exterior também. Como está sendo isso tudo para você, esse retorno, o reconhecimento pelo seu trabalho duro e como tudo começou? E quais as dicas que você deixa para aqueles que, como você, estão correndo atrás de seus sonhos e com um imenso desejo de ver o seu trabalho reconhecido?


R: Culpo os obstáculos do cinema por eu ter me tornado um escritor. Minha grande paixão, desde pequeno, sempre foi a sétima arte. Acabei me formando em cinema e atuo até hoje no ramo. Todas as histórias que escrevo surgem primeiro como roteiros cinematográficos. Mas como são complicados de conseguir patrocínio, adapto e mando para as editoras. Foi assim com o meu primeiro livro. O "À Sombra da Lua" é um projeto de cinema, ou série para a TV, de orçamento muito alto. Quando percebi que demoraria para chegar no público, reescrevi como romance. Tenho um carinho especial por esse livro. Ele foi aceito pela Rocco e indicado ao Jabuti de Melhor Romance em 2013. Há planos futuros bem concretos pra esse título, inclusive uma continuação. Meu segundo texto publicado foi a versão para as prateleiras do "Condado Macabro". O editor da Simonsen estava na sessão durante uma Mostra em São Paulo e me procurou. Ele já me conhecia pelo primeiro livro e gostava muito do roteiro do Condado. Foi publicado junto com a estreia nos cinemas. Também há novos planos para ele, mas não tão concretos.
No cinema, minha carreira é bem diferente. É mais voltada à crítica que ao mercado. Em 2001 ganhei meu primeiro Kikito no Festival de Gramado com o curta "Vídeo Sobre Tela" e depois em 2007 com o "O.D. Overdose Digital". Mas o curta "Uninverso", de 2004, foi meu filme de maior destaque em festivais, rodando o mundo em mostras, sendo exibido em alguns canais de TV pela Europa e ganhando várias premiações. Meu primeiro longa saiu em 2015 e não esperava a repercussão. Foi um trabalho feito sem grana, sem grandes intenções, mas que acabou sendo vendido para vários países e está até hoje na grade da rede Telecine, além de estarmos negociando com a Netflix. E este ano sai o "Histórias Estranhas"; um longa antologia que faço parte com o segmento "Apóstolos".
A dica é a mesma de sempre: nunca desistir. Você precisa persistir no que quer. Na maioria das vezes o mercado tentará destruir seus sonhos, te colocar lá pra baixo e ele faz muito bem essa função. São muitas derrotas consecutivas para se ter uma vitória. Só que para os outros, que estão vendo tudo de longe, só aparece a parte boa.
Se você quer ser um escritor, continue escrevendo e enviando seus originais para todas as editoras possíveis que recebam seu gênero. Revise sempre, mande para amigos darem opinião, aceite as críticas, reescreva e mande. Lembre-se que o “não” você já tem. Tudo que vier diferente disso é lucro.
Para cinema é um pouco mais complicado porque é um ramo caro. Se você não tem como investir tempo e dinheiro nas suas obras, seria bom participar de outros filmes e ir conhecendo uma equipe que trabalharia de graça com você por amor ao projeto. E a partir daí ir crescendo, buscando editais, patrocínio... Também é importante estudar a parte técnica. Existem alguns detalhes que precisam ser respeitados para não criar algo amador que não terá chances de ingressar no mercado.




7-Que novidades podemos esperar para 2018?

R: Já no começo do ano será publicado, também pela Faro Editorial, o meu quarto livro. Ainda não estou autorizado a revelar o título, mas é um estilo diferente de todas as minhas histórias anteriores. Ainda é de terror, mas sem violência gráfica. É sobre o retorno de um jovem a uma casa que ele acreditava ser assombrada quando era mais novo. Ele volta para confrontar o medo, buscando indícios de que tudo não passava de imaginação infantil, até rever a criatura certa noite e ela começar a assombrar o seu irmão mais novo.
É um texto diferente dos que já escrevi. Poucos personagens, um único cenário, mais curto...Ele traz uma discussão muito forte sobre traumas, família e adolescência. Seria um tipo de livro Young Adult, só que de terror. O miolo está espetacularmente lindo, com duas cores e várias ilustrações. Deve sair em abril e é outro trabalho que estou muito orgulhoso. A Letícia Spiller, que fará uma das personagens na versão para o cinema, escreveu a frase da capa.


Marcos, o Você não pode deixar de ler, assim como eu desejamos muito sucesso em sua jornada, estaremos de camarote acompanhando todas essas novidades e curiosíssima para ver o que Abril nos aguarda! 
Foi um prazer bater esse papo contigo e espero que seja o início de uma longa amizade. Mais uma vez parabéns pelo belíssimo trabalho!



Lindaiá Campos
#vcnpdeixardeler






Curiosidades

Em 2018 o primeiro livro publicado por Monteiro Lobato, intitulado “O Saci-Pererê: Resultado de um Inquérito”, completará 100 anos de seu lançamento.
A obra começou a ser concebida em 1917, quando Monteiro lobato propôs aos leitores do “Estadinho”, suplemento do jornal O Estado de S. Paulo, do qual era colaborador, que enviassem cartas contando tudo o que soubessem ou tivessem ouvido falara sobre o mito do Saci-Pererê.
Especificamente, tratava-se de um pequeno questionário (um inquérito) que as pessoas deveriam responder e enviar ao jornal.
O inquérito recebeu dezenas de respostas, que apresentaram tons variados. Muitas traduziam uma nostalgia de infância passada em fazendas do interior de São Paulo e Minas Gerais, outras atribuíam a crença no Saci à ignorância da população rural. Havia também referências a outras lendas brasileiras, como a mula-sem-cabeça e o boitatá.
A primeira edição da obra foi lançada em 1918. O livro foi Autopublicado e para financiar a tiragem inicial de 2000 exemplares; Lobato acrescentou anúncios publicitários desenhados por Voltolino, nos quais o Saci apresentava e recomendava diversos produtos.

Monteiro Lobato, porém não assinou a obra como autor, considerando que o seu papel havia sido apenas de editar os textos que recebera.


Você conhece outros contos diferentes do de monteiro Lobato, do Escravo de Capela? Deseja ou já escreveu um conto sobre ele?



Envie o seu conto para nós e concorra a um kit exclusivo e seu conto será publicado no nosso blog!

Resenha: O Curioso destino de Rita Quebra-cama e outros contos



Sabe aquelas cenas de novelas de antigamente, onde temos as famílias de fazendeiros tradicionais no Nordeste, o cotidiano de toda essa gente singular além é claro de muitos rebuliços.

Essa foi a exata sensação que sentir ao ler os sete contos de Ricardo Ishmael.  Dizem que sete é a conta do mentiroso. Talvez até seja uma conta que nos caia muito bem como escritores.

O Curioso Destino de Rita Quebra – cama vem nos contar causos de maneira fácil, bela narrando tradições populares da Bahia se lembrando de conservar na integrar seu dialeto, parabéns Ricardo.

Com uma linguagem rica e simples, a obra nos ensina e convida a desmistificar algumas coisas, a encarar a vida exatamente como ela é independente da forma, cada qual do seu jeito.



Como diz Dona Maria de Santa Fé em O Ultimo Rebuliço, primeiro conto de O curioso destino de Rita Quebra – Cama, a luta ou a vida é para os fortes, uma missão para quem tem coragem. E ela teve coragem para enfrentar a disputa pelas terras, tão comum dos índios aos dias atuais, tudo sempre com um preço. Como acontece em A pessoa é para o que nasce.”